21 abril 2005

BIOGRAFIA ROCK PORTUGUÊS (Por Nuno Galopim)

Em finais de 70, o cenário musical português conhecia uma inevitável série de transformações. Ultrapassada uma etapa de politização das artes, consequência directa da revolução de 74, os espaços das músicas ligeira e popular voltavam a ganhar notoriedade e terreno para divulgação. Rock? Sim, desde inícios de 60 que por cá soava e se fazia, mas nunca com o empenhamento da indústria nem a benção dos media... Em finais de 70, nomes como os Tantra, Arte e Ofício, Beatnicks, a discreta mas importante geração punk e sua imediata descendência, entre alguns mais, mostravam querer um lugar ao sol que tardava...
Chegamos a 80 com um acumulado de desejos. Desejos de uns em encontrar uma música que definisse a sua identidade portuguesa, jovem, renovada. Desejos de outros em mudar cenários, em transformar pela positiva. Desejos também de marcar terreno pela diferença. Num cenário que mais parecia de conto fantástico que do mundo real, a alvorada de 80 assistiu a um curioso fenómeno de confluência geracional entre quem fazia música, quem a editava e quem a tocava na rádio. Todos, todos tinham mais ou menos a mesma idade. E num ápice, a soma dos desejos ganhava uma transversalidade a todo o meio. Só faltava a matéria-prima.
Apesar de algumas experiências pioneiras que vinham de trás, muitas das aventuras rock no Portugal de 70 faziam-se em inglês. Num momento em que a exposição ao pop/rock internacional chegava às rádios, as diferenças técnicas e de construção eram evidentes. Ao mesmo tempo, pouco havia de comunicação efectiva entre muita dessa música e o cidadão jovem, que optava então pelo importado, já bem empacotado. Contudo, na recta final de 70 e inícios de 80, uma série de bandas ousam a procura de uma identidade rock em português: UHF, Rui Veloso, GNR, Salada de Frutas... Uns após outros gravam discos de estreia, o que em primeiro lugar acontece pelo entusiasmo e boa fé de quem editava. Surgem os primeiros êxitos na rádio, na TV. Outras bandas, a começar carreiras mas com canções em inglês, mudam as letras para português... E no Verão de 1980 o novo «rock português» começa a falar tão alto quanto os Police ou os Fischer Z...
O single era, na maior parte dos casos, o veículo da revelação e instituição dos novos nomes que chegavam à ribalta a um ritmo estonteante. Uns com mais artes e ideias, outros mais dados à concretização imediata de uma gracinha oportuna, bandas e novos músicos revolucionaram o meio, não só pela definitiva inscrição do português como língua oficial da comunicação musical da geração de 80, como pela forma como então partiram para a estrada e abriram terreno para a construção de digressões, episódio fundamental na história da profissionalização da música portuguesa.
Na melhor tradição lusitana instalou-se um fenómeno de procura que, imediatamente, desencadeou uma fúria de oferta. Tudo o que tivesse ar de banda e arranhasse umas guitarras a cantar em português era alvo de curiosidade. E muitos gravaram discos mesmo sem ter mais canções com as quais pudessem pensar o passo seguinte de uma carreira. Fruto do exagero, a implosão chegou em 1982. Como no mundo natural, a selecção encarregou-se de repensar o futuro. Nascem então novas bandas, com propostas mais sólidas e elaboradas, às quais se juntam os sobreviventes mais aptos da geração anterior.
Neste disco recordamos alguns dos muitos momentos dessa festa que foi a descoberta de um som pop/rock em português. Entre os nomes que perduraram e outros que só brilharam nesses dias de maior euforia, aqui estão verdadeiros clássicos dessa aventura que entusiasmou tudo e todos nos inícios de 80.

Nuno Galopim, Junho 2003

1 comentário:

Anónimo disse...

http://www.instituto-camoes.pt/cvc/disco/89/disco089.html

Esse disco acompanhava a edição da primeira compilação "O Melhor do Rock Português". E pena que a EMI não tenha sido mais ambiciosa e pudesse ter feito uma dupla colectânea mais abrangente. As outras editoras apesar de alguma promessas também tem esquecido o fundo de catálogo (compilações, reedições, edições comemorativas). Não sei se o problema é falta de mercado ou pouca promoção a essas edições.